REFERENCIAÇÃO EM NARRATIVAS ESCRITAS DO IMAGINÁRIO LENDÁRIO DA AMAZÔNIA: UMA ANÁLISE DA CONSTRUÇÃO DOS REFERENTES EM DÊIXIS NO CORDEL “O CHAPÉU DO BOTO”
O Chapéu do Boto; Juraci Siqueira; Cordel Amazônico; Referenciação; Dêixis.
Esta pesquisa, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Oeste do Pará (PPGL-Ufopa), insere-se na área da Linguística e nas subáreas de Linguística Textual, bem como vincula-se ao tema das operações referenciais e enunciativas em Narrativas da Amazônia Paraense. Partindo disso, o objeto de análise é o fenômeno da Dêixis no cordel amazônico “O Chapéu do Boto” (edição de 2007), do cordelista paraense Antônio Juraci Siqueira. O problema que norteia esta investigação é “Como os elementos dêiticos no cordel ‘O Chapéu do Boto’ contribuem para a referenciação e para a ancoragem enunciativa do contador, do leitor, do espaço e do tempo na narrativa?”. Como justificativa, a investigação busca aprofundar a reflexão sobre a identidade regional paraense, preenchendo lacunas sobre operações dêiticas na obra de Siqueira, além de analisar processos linguísticos específicos da Amazônia, como a ancoragem enunciativa via dêixis, que situam o leitor no universo narrativo e resgatam a memória coletiva. O objetivo geral da pesquisa é: analisar o papel dos elementos dêiticos na referenciação no cordel “O Chapéu do Boto”, investigando como as marcações dêiticas contribuem para a construção dos objetos de discurso e para a ancoragem enunciativa que articula o contador, o leitor, o espaço e o tempo na narrativa. Os objetivos específicos são: 1. Observar os aspectos temáticos e estruturais do gênero cordel na narrativa analisada; 2. Identificar os objetos de discurso que são instituídos e retomados no cordel “O Chapéu do Boto”; 3. Especificar os tipos de referentes em Dêixis no cordel em análise; 4. Analisar o papel das marcações dêiticas na “ostensão” e na “subjetividade”, como a referenciação, a ancoragem do contador, leitor, espaço e tempo, bem como demais aspectos encontrados. Quanto aos métodos e técnicas, a pesquisa é quali-quantitativa e interpretativa, utilizando métodos descritivos e bibliográficos. A coleta de dados envolveu técnicas da Revisão Sistemática da Literatura e a análise de conteúdo de Bardin (2011), focando nas operações referenciais presentes no texto "O Chapéu do Boto". Entre os resultados, tem-se que: 1. Quanto à estrutura do cordel, com sua alternância entre setilhas, sextilhas e rimas (brancas, toantes, consoantes), aliada às ilustrações de Waldir Lisboa, reforça a oralidade característica do gênero. Os dêiticos, nesse contexto, atuam como elos que garantem fluência narrativa e imersão, permitindo que a história transite entre o real e o fantástico sem perder sua raiz cultural.; 2. Em relação à ancoragem enunciativa, observou-se que os dêiticos pessoais, como “rogo atenção” e “Vovó contou-me”, aliados aos verbos imperativos “Conte um conto” e “Abra as porteiras”, estabelecem um diálogo direto entre o contador e o leitor. Essa estratégia não apenas convida o público a assumir o papel de coautor da narrativa, mas também garante sua perpetuação como um ato de resistência cultural, em que a oralidade se mantém viva através da reinscrição contínua da história; 3. Quanto aos dêiticos de marcação espaço e tempo, a exemplo dos advérbios “lá” e “ali”, bem como a locução “às margens do Cajary”, situam a trama em um contexto geográfico reconhecível, reforçando a autenticidade do imaginário amazônico. Esses marcadores não apenas delimitam o cenário físico, mas também aproximam o leitor da vivência regional, criando uma sensação de proximidade com o universo narrativo; 4. A memória coletiva emerge como eixo central por meio da expressão “nossa mitologia”, que opera como uma dêixis identitária. Essa construção linguística vincula contador e ouvinte a um repertório cultural compartilhado, no qual a figura do Boto transcende o mito individual para encarnar conflitos éticos e sociais da região, como a relação entre humanos e natureza, além de questões de gênero e poder.